Disseram-me um dia
Que um dia
Um velho amigo,
Amigo meu, dos meus dias infernais,
Jazia na sombra de uma árvore triste,
Mas ele cantava, de mansinho e com muita fé
Cantava numa tarde sombria de paixão!
Porque razão afinal cantava!?
Ele cantava, porque buscou e não achou,
Pediu e não lhe foi dado,
Mas ele ainda cantava pela sua nua dor,
Cantava, porque só sabia cantar e cantar!...
Disseram-me um dia,
Que um dia, ele sentia no espírito duas almas
Uma sua e outra de sua amada,
Por isso ele sofria, sofria e sofria,
Oh! Sofria calado e triste,
Triste e enfermo de amor!
Que pandemónio passional!...
Disseram-me um dia
Que um dia, no cair das noites
As dores se multiplicavam nele, como areias das praias!…
Ele se acamava,
Mas com um oceano de saudades,
De tanto flutuar em rios de sofreres, conclamava,
Nos seus clamores turbulentos ele dizia:
Aiwe, aiwe, aiwe, aiwe!...
Ó Detentor da minha alma,
Ó retentor das minhas culpas
Ó eterna esperança, meu vindouro mundo!
Ó criador da existência!... Minha alma está cansada,
Meu corpo está dorido para valer
E minha alma sem asas para voar!
O que faço eu, aqui neste deserto de amor?
Aqui neste mar de lágrimas?
Aqui neste paraíso de felicidade infernal!...
Disseram-me um dia
Que um dia
Este velho e amigo meu, não comia,
Não bebia,
Nem conseguia lamentar por si mesmo,
Porque sua amada levou-lhe o que mais não odiava,
Na felicidade do seu olhar manso!... Partiu! Partiu, Partiu!...
Disseram-me um dia
Que um dia,
Às vezes, ele fingia como se não tivesse acontecido nada,
Mas as suas próprias lágrimas o traiam,
Inundavam o seu rosto,
Corriam dos seus olhos como rios
Que se precipitam nas cachoeira de sua órbitas
Como vendavais de saudades de um sobrenatural!
Disseram-me um dia
Que um dia,
Este velho meu, às vezes também chorava,
Dispensa consolação,
Porque tarda chegar!...
Disseram-me um dia
Que um dia,
Este meu velho amigo,
Partirá para sempre
E nunca mais o veremos,
Nem os nossos olhos o verão mais um dia!...
Tudo nele será pó ou cinzas,
Até ele esquecer-se-á de si mesmo!
Disseram-me um dia!...
Que ele partiu, ontem,
Não me lembro bem!...
Ele partiu…
Disseram-me um dia!...«KILON, O PROFETA»