Doem-me
Olha para aquela mulher,
Mulher, de panos negros,
Negros como as noites sem estrela, sem luar…
Com uma trouxa de revolta no seu eu,
A trouxa da revolta contra o mal
Que enferma a alma de seus filhos, sua gente
E nos cantos dos seus olhos,
Dilúvio de lágrimas corre vagamente,
Corre, corre, corre …Com ar de dores!
Quem a vai consolar!?...
Oh!
Mulher, pobre no olhar,
Mas com alma dourada!...
Olha para aquela mulher,
Mulher, de panos pretos,
Mulher, minha avó,
Contos e fadas granizavam de sua boca!
Mulher,
Oh! Aquela que trazia-me
O passado no presente,
O ouvir dos meus ouvidos
Abria-se para esse contrato!
Mulher, com a pele que caminha no Outono!
Poemas escritos no seu olhar,
E na sua voz afónica pelo tempo,
Revelava tudo quanto os anos silenciaram!
Mulher, querida mãe,
Aquela que não se fartou de mim
Dava-me tudo, até aquilo que não tinha!
Mulher, razão do brilho do meu olhar,
Guarita de minha vida,
Presente incomparável da minha vida!
Ouvia-a, oiço-a e ouvi-la-ei o tempo todo,
Até meu ultimo suspiro
Seus sábios conselhos!
Mulher, minha linda amada,
Beleza que o destino me sugere!
Olha para aquela mulher
De um olhar sombrio,
Quem a vai consolar?!...
Ela farta-se de dores!
Oh! Mulher, mulher, mulher!...
Olha para aquela mulher,
De panos pretos
Sem se esquecer da sua trouxa de lamentações,
Lamúrias com cor de relutância contra as sombras!
Escuta-me, pois eu falarei
Na luz do meu próprio bradar
Com os seus ouvidos ouvirás,
Não o bradar de um profeta,
Mas o bradar de quem sabe frasear…
Frasear de verdade!... Ó minha gente!
Escuta-me, escuta-me, escuta-me…Gente!
Hoje, meus olhos vêem
A pobre mulher no rio de lágrimas
Minha alma fere-se com seus queixumes
Ao romper da noite ela chora e muito
Pelos filhos consumidos
Pela guerra,
Pela fome,
E por aquilo que minha alma se entristece
Na sua lembrança,
A dor multiplica-se nela,
Multiplica-se como área da praia,
Porque seus filhos caíram na maldade
E neles cresce como ervas do campo,
Afinal, são amigos da escuridão,
Ao nascer do sol,
Sua lembrança acusa os açoites
Que vinham do seu próximo, sua gente,
Gente que a trata como uma nudez,
Ou uma coisa que não me lembro!...
Afinal quem a vai consolar?!
Ampara-la, ou segurar no fio da sua dor!...
Será, meu lamento,
Ou minhas lágrimas
Que caem das minhas órbitas secas?
Será?!...
Olha para aquela mulher
De panos pretos,
Quando sua juventude vem do passado,
Juventude que o tempo consumiu
Longe do meu olhar rosado.
Suas lágrimas rolam do seu rosto
E inundam seu peito vazio
Sua voz fuzila como as vagas!
Olha para aquela mulher
De panos pretos
De olhos sombrios,
Escute com seu próprios ouvidos
O que minha boca vai dizer… no rugir dos ventos!
Aquela mulher, ó minha gente!
É minha mãe,
Seu clamor está presente nos versos
Da minha poesia… poesia que nasce,
Que nasci da minha alma vagabunda!
Olha para aquela mulher,
Com mestria de compaixão,
Gente minha que chora sem fim!
Olha para aquela mulher!...
Mulher, minha gente!
Gente com resplendor de anjos!
O PEQUENO
Havia um pequeno
Pequeno, que o tempo e a morte já consumiram,
Seu olhar já não é físico!
Ele era baixinho, mas não falava muito,
Um dia, do alheio Surgiu um tumor,
Mas o maligno, gratuito absurdo!!!...
Afinal era um grande mal… era sim!
Este apoderou-se dele,
O pequeno só sabia sorrir, seu único crime!
Pureza de um anjo Azul-celeste!
Este tumor consumiu seu corpo,
Mas não se esquecia de crescer,
O baixinho ficou seco, seco, seco, seco… muito seco!
Sua mãe lutou, lutou, lutou,
Com unhas e dentes,
Gastou muito até aquilo que não tinha,
Mas o mal é mesmo ingrato!
O maligno nele se agravou,
Viajaram pelos hospitais e clínicas,
Pelos kimbadas e santas
Pelos profetas e quem sabia curar sem limites…
Tudo naquele dia era uma praia vazia!...
O silencio e as sombras vinham!...
Depois a esperança faleceu,
O tempo a levou sem piedade,
Oh! Mas a levou para muito longe, longe mesmo!
Eis o pequeno,
Ei-lo na primeira pagina do jornal de lamurias!
Nas paginas secas da solidão,
No seu último dia,
Dia de sua partida
Para o mundo do silencio,
Onde respirar é um crime!
Naquele dia, seu fim e sua partida,
As portas da morte se abriram,
O caminho do campo-santo
Não perdeu a pista,
Oh! a dança começou!...
Ao por do sol, partida para o alem!
Para sua mãe cochichou:
Doem-me as ferramentas ósseas,
Avizinha-se a sombra do fim carnal,
Pouco a pouco toma conta de mim,
Vou partir, pois dói-me entristecidamente a alma,
Vou para o eterno repouso,
Afinal vou cumprir a profecia da vida,
E tomar parte do barco do destino!
Agora, minha mãe,
Dá-me de comer,
Mas comer de verdade,
Porque partir é única coisa que me resta
Como minha consolação!
Comeu, comeu, comeu…
Mas com muita ira!
Saciado, o pequeno adicionou:
Mãe, vou partir já,
Porque oiço o silêncio eterno a chamar por mim!
Minha mãe, querida,
Tenha coragem de enfrentar a vida o tempo todo
Tenha cuidado com ela
E quanto ao resto só Deus sabe!..
Reze,
Cante,
Louve ao Criador
De dia ou de noite
Nos montes ou nos vales
Na escuridão ou na clareza!..
Dali, o pequeno dirigiu seu olhar para os céus,
Levou suas mão às órbitas,
Limpou suas lágrimas de via … baixou a cabeça e partiu,
Partiu para sempre, partiu mesmo!
Mas nos braços de sua mãe, para nunca mais!
Nunca mesmo, nunca!...
Sua mãe mergulha na dor e no luto,
Suas lágrimas secaram,
Porque chorou de mais,
A dor já lhe tinha consumido as lágrimas,
Pranteava, seus olhos, saltava-lhe das órbitas!
Não aceitava consolo de ninguém…
Não se esqueçam, ó minha gente,
Gente amiga,
O menino que meus olhos conheceram,
Partiu para sempre, para nunca mais!
Para nunca mais o conhecer!...
O pequeno partiu,
Em nós a saudade cai como
Chuva de Fevereiro!
O tempo se esqueceu de preencher o vazio…
A saudade nem se quer é enganada…
Da minha lembrança,
Lembro-me dos gemidos do pequeno,
Partiu num país de agora,
Longe da justiça imaculada
Ele partiu, não é sonho,
É aquilo que os homens,
E os livros se recusam contar…
Se calhar partiu,
Porque não tinha…é mesmo?!..
Quem vai consolar aquela pobre mãe?!
Saudosa e triste o tempo todo.
Ainda hoje, aquela mulher,
Sua almofada acolhe as lágrimas
Todas as noites…
Que arte de sofrer!...«KILON O PROFETA»